quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Soluções para o prpblema da segurança pública

Fernando Capez. Jurista.


A atual crise da segurança publica, que tem como conseqüência a falência do sistema carcerário no Brasil, é resultado de anos de descaso do Poder Público para com essa questão.

O anúncio de falência dos presídios brasileiros já é ouvido há muito tempo, mas infelizmente em nosso País não há o hábito de se fazer planejamentos a médio e longo prazo. Tanto que há mais de 20 anos a questão carcerária tem sido renegada ao completo esquecimento. Na década de 80, estudantes de direito já falavam de organizações criminosas como a Serpente Negra, da penitenciária estadual de São Paulo. No entanto, nunca se fez absolutamente nada a respeito disso.

O fato é que uma lei penal, ainda que bem elaborada, não pode surtir os efeitos almejados se não tivermos uma polícia bem equipada para prevenir e reprimir a violência, além de um adequado sistema de execução da pena. Ora, de nada adianta obter uma sentença condenatória após entrar com a ação se, na fase de execução da pena, o Estado não tem condições de dar aplicabilidade à lei penal ou o faz através de um sistema penitenciário corrupto – onde são permitidos telefones celulares, armas, entorpecentes, dinheiro e os presos são resgatados por helicópteros.

Sempre se alertou quanto à necessidade de construção de presídios de segurança máxima, que isolassem criminosos de alta periculosidade, porém, isso nunca foi prioridade. Não houve investimento do governo federal. Enquanto se dava esse descaso por parte das autoridades federais, a população carcerária do Estado crescia com o grande número de prisões realizadas pela polícia do Estado de São Paulo. O resultado não poderia ser outro: o sistema carcerário “explodiu”. Os aglomerados de presos em uma única cela permitiram a formação dos grupos criminosos que vêm provocando essa onda de crimes contra as instituições públicas e a sociedade.

Deve-se ressaltar que há no Estado de São Paulo cerca de 700 líderes e cabeças de organizações criminosas que estão completamente isolados. É urgente que mais membros de organizações criminosas sejam submetidos ao regime de isolamento total, sem qualquer comunicação com o mundo externo, sendo as visitas de familiares e advogados permanentemente monitoradas.

A situação requer ainda que sejam feitos mais investimentos no setor, para dar garantias e estrutura aos agentes penitenciários. São funcionários de extrema importância para a manutenção da ordem e disciplina nos presídios. Vale lembrar também que o agente penitenciário que trabalha, permanentemente, no mesmo local, tende a ser aliciado pelos presos com o passar do tempo. Assim, é necessário que haja um rodízio de agentes, de forma que não permaneçam por muito tempo no mesmo estabelecimento carcerário, a fim de evitar sua cooptação pelo crime organizado e de preservar sua integridade corporal.

Sob o ponto de vista técnico, e não ideológico, o investimento privado seria medida salutar para a solução da crise carcerária, e é justamente por isso que defendo a privatização dos presídios. São imprescindíveis investimentos privados maciços na construção de casas de albergados, colônias penais, de presídios modernos e estruturados, de forma a garantir tanto os direitos dos presos quanto a segurança da sociedade. Precisamos de presídios de segurança máxima, que possam abrigar adequadamente e com segurança membros de organizações criminosas. O Estado, por outro lado, deve procurar uma forma de fazer com que aquele que investe consiga obter remuneração mediante o trabalho dos presos.

Ao lado da questão carcerária, temos a crise dos órgãos de segurança pública. Com a falta de verba federal, os policiais são destituídos de estrutura para o trabalho. Aliado a esse fato, recebem parcos salários para combater uma criminalidade organizada. O Governo Federal ainda não se deu conta de que não estamos mais diante de “ladrões de galinha” de ou trombadinhas, mas de criminosos altamente organizados, que portam granadas e fuzis e praticam delitos graves como tráfico de armas e de entorpecentes.

Em episódios como esses que estão ocorrendo atualmente em São Paulo – em que a criminalidade organizada buscou a rendição das autoridades policiais por meio de inúmeros atentados – constatamos o grande valor das polícias para o zelo do Estado Democrático de Direito.

Por serem os verdadeiros guardiões desse Estado, não podem ser relegados a um segundo plano. Assim, juntamente com o investimento nos presídios, constitui ume medida salutar o investimento do Estado no material humano de nossas polícias. Embora a Polícia Civil e a Militar tenham estruturas de inteligência bastante razoáveis, faz-se necessário investir no policial em si. A oferta de infra-estrutura adequada ao policial, fornecendo armamentos e viaturas, por exemplo, não pode ser a única medida adotada. É preciso introduzir estratégias motivacionais que estimulem a produção do servidor público. Deixá-lo motivado poderá trazer resultados ainda maiores.

É preciso atentar, enfim, para o fato de que não estamos dentro de um quadro normal de criminalidade, ou seja, aquele esperado, tolerado pela sociedade. O Governo Federal não se deu conta de que a política de segurança pública da qual dispomos serve para o combate de uma criminalidade existente nos idos do século passado. Quando esse padrão de criminalidade esperado extrapola os limites do tolerável – e quando se constata que essa criminalidade busca a rendição do Estado e não mais de vítimas isoladas –, não podemos mais dispor dos mecanismos jurídicos e dos mesmos critérios de política criminal até então utilizados, pois tais critérios são adequados somente a uma situação de normalidade e não de caos, ou, para ser mais contunde, de guerra urbana, como a que vivemos.

O lema do crime organizado não é “A união e força”? Faz-se necessário, então, que esse passe a ser o lema das autoridades incumbidas da manutenção da ordem pública, sob a pena de essa disputa provocar a cisão do Estado Democrático de Direito.

Enquanto não houver um consenso na política de segurança pública; enquanto a política de segurança pública for norteada por disputas eleitoreiras e ideológicas e não por critérios técnicos; enquanto a segurança pública não for vista como a pedra angular da manutenção das instituições democráticas, só há um veredicto: seremos eternos reféns do PCC e de seus futuros herdeiros. E em pouco tempo tal situação não terá mais volta.


FONTE: *Fernando Capez Promotor de Justiça e Deputado Estadual. Presidente da Comissão de Constituição e Justiça da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo. Mestre em Direito pela USP e doutor pela PUC/SP. Professor da Escola Superior do Ministério Público e de Cursos Preparatórios para Carreiras Jurídicas.

Um comentário:

  1. Caros Colegas,
    muito interessante, o comentário. Mas Fernando Capez deveria interagir com algumas cabeças pensantes da polícia civil do MA, para constatar que para estas bandas já se aplica a muito tempo as "estratégias motivacionais" por ele defendida.

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