domingo, 14 de abril de 2013

A PEC 37 e o direito comparado


  A PEC 37 e o Direito comparado

È lamentável a forma pela qual o MP tem se colocado diante do debate acerca da PEC 37. Argumentos nada democráticos, sem base legal e cheio de sofismas são utilizados na sua campanha de desinformação.

É preciso que se diga que em lugar algum do planeta o MP detém tantos poderes e atribuições como no Brasil, não se encontra paralelo no direito comparado.

O que afinal se está discutindo? Se o MP é melhor ou pior que a polícia? Na verdade a discussão tem como foco saber se dentro do sistema legal vigente NESTE PAÍS, se dentro do atual estado democrático de direito o MP “pode ou não” investigar. A resposta só pode ser uma: Não!

Neste diapasão são pertinentes as palavras de um dos maiores juristas da atualidade, Guilherme NucciA polícia existe para isso. Delegados, investigadores, detetives, agentes da Polícia Federal são pessoas pagas para investigar. A atividade investigatória foi dada, no Brasil, ao delegado de polícia, concursado, bacharel em Direito. Não é um xerife, um sujeito da cidade que é bacana e que a gente elegeu xerife e que portanto não entende nada de Direito. Nossa estrutura é concursada, democrática, de igual para igual. Não existe isso de “ele é delegado, então ele é pior; eu sou promotor, sou melhor”. Tem corrupção? Então vamos em cima dela, vamos limpar, fazer o que for necessário. Agora, não podemos dizer que, porque a polícia tem uma banda corrupta, devemos tirar a atribuição dela de investigar e passar para outro órgão.

Somente por meio de interpretações cabalísticas e muito contorcionismo jurídico pode-se chegar à conclusão diferente.

 Não se trata de “achar” que eventual investigação do MP seja interessante ao combate da criminalidade, mas sim, determinar se tal investigação é legal ou não. Restrições às liberdades públicas precisam ser feitas sob o pálio da legalidade estrita e não com base em resoluções que extrapolam e muito o seu poder regulamentar, como é o caso da resolução nº 13 do CNMP.

Ora, se desejarmos que o MP investigue, então que seja tudo dentro da legalidade, dentro do que exige a Constituição Federal. Que sejam criadas Leis específicas regulamentando a forma dessa investigação (prazos, formas, comunicações etc) e principalmente determinando quem exerceria a fiscalização dessa atividade. Seria o MP a fiscalizar a si próprio? Que o MP não fique se utilizando de outras forças policiais como a Polícia Militar, Polícia Rodoviária e até guardas municipais sem amparo legal. É preciso rezar a cartilha da LEGALIDADE. Investigar só o que deseja, como e quando quiser não é democrático nem republicano.

Não esquecer que o MP já tentou por oito vezes aprovar propostas de emenda à Constituição Federal estabelecendo seu poder de investigação e nunca obteve êxito, tentativas que remontam a constituinte de 1988, portanto, o poder de investigação só é claro aos olhos do próprio ministério público, uma vez que OAB nacional, AGU, IBCCRIM, juristas da lavra de José Afonso da Silva, Luís Flávio Gomes, Ives Gandra e muitos outros são contrários à investigação realizada autonomamente pelo MP.

Vejamos o que diz o direito comparado.

Nos Estados Unidos por exemplo a investigação ministerial deve ser em conjunto com a polícia, o promotor nos EUA pode ser sumariamente exonerado do cargo pelo prefeito! Portanto, não há razoabilidade em tal comparação. Nos Estados Unidos da América, não existe um juiz investigador ou um juiz de instrução (sistema em declínio). A fase da investigação inicial está confiada aos agentes policiais e às agências federais de investigação, que logo entregam o informe (nada mais que o nosso inquérito policial) ao Promotor e este então determina se há ou não elementos para apresentar a prova ante o ‘Grand Jury’.

Em outros países da Europa o MP integra a própria carreira da magistratura (bem diverso do que acontece no Brasil), vejamos.

 Na Itália o Ministério Público (‘Publico Ministero’) integra o corpo da magistratura – além de dirigir a Polícia Judiciária, que lhe é auxiliar, e a investigação preliminar, pode desempenhar pessoal e diretamente todas as atividades investigatórias permitidas à Polícia Judiciária. Mas fica a pergunta: No Brasil o MP integra a magistratura? A resposta é não, o MP está atrelado ao Poder Executivo tanto quanto a Polícia Judiciária, percebam que o Chefe do MP é nomeado pelo Governador do Estado.

 Na França ( O promotor também integra a carreira da magistratura) é a autoridade judiciária quem exerce o controle da polícia judiciária, por uma razão lógica, é o juiz o guardião das liberdades individuais. (há nesse país a figura do juiz de instrução, também em declínio).

Na Inglaterra ocorre algo parecido com o sistema brasileiro. É a polícia a responsável pela investigação e pela acusação. Se for acusado, o suspeito terá direito a receber detalhes escritos sobre o delito imputado, que poderá encontrar-se em uma ‘lista de acusações no juizado de polícia’. A Polícia entrega então o caso ao Serviço da Promotoria da Coroa (‘Crown Prosecution Service’), o qual notifica e prepara o caso para o julgamento. É dever da polícia, com o conselho do serviço da Promotoria da Coroa, reunir as provas para sustentar uma acusação. Lá o serviço da promotoria é realizado por advogados assalariados, o seu papel é o de aconselhar a polícia, revisar a decisão de acusação e preparar os casos para julgamento e apresentá-los aos Tribunais.

“Ressalte-se que, nos mencionados países europeus, mesmo sendo o Ministério Público quem dirige as forças policiais durante toda a duração da fase preparatória, na prática, porém, constata-se, amiúde, que esta dependência funcional é mais teórica que real, e que a polícia goza freqüentemente, de fato, de uma verdadeira autonomia”.( http://www.abjt.org.br/index.php?id=99&n=92-)

Como podemos perceber a persecução criminal possui diferentes matizes, aqui temos uma estrutura organizacional concursada, lá os chefes de polícia não são graduados em direito, não há muita similitude no critério de seleção, é tudo bem diverso do que acontece no Brasil, portanto, totalmente desarrazoado o paradigma.

A PEC de forma alguma retira poderes investigatórios do MP, a PEC  apenas torna claro dispositivos constitucionais; não impede de forma alguma investigações administrativas da Receita Federal, Ibama, Banco Central, CPI e outros. Relatórios de investigações administrativas realizadas por tais entes poderão ser encaminhados diretamente ao MP que poderá ofertar denúncia ou requisitar mais diligências policiais.

O MP é hoje uma instituição hipertrofiada o que tem prejudicado sua atuação em áreas tão importantes quanto a criminal. Não se deseja alijar o MP das investigações criminais realizadas pela Polícia Judiciária, ao contrário, deseja-se que essa instituição trabalhe em parceria, obedecendo aos ditames legais do ordenamento pátrio ou que, finalmente, sejam criadas Leis que possam permitir a investigação por instituição de importância fundamental à democracia.

Márcio Dominici
Delegado de Polícia



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