sexta-feira, 26 de abril de 2013

PEC 37 - verdades que precisam ser ditas!




Antes de qualquer posicionamento é imperativo que se estabeleça a real dimensão e conteúdo desta discussão. Sem sofismas e sem terrorismo midiático.
Frise-se, por oportuno, que a PEC em nada altera os poderes e atribuições do MP, apenas deixa explícito o que já dispõe a legislação pátria, conforme tem afirmado ampla comunidade jurídica (OAB nacional e várias seccionais, AGU, Defensorias, juristas como Luis Flávio Gomes, Luís Roberto Barroso, Ives Gandra, Guilherme Nucci, César R. Bitencourt e outros)
Sabe-se que o direito é pura interpretação e que a interpretação não se esgota, mas veremos mais à frente que em determinadas áreas a interpretação deva ser restrita, não comporta devaneios e contorcionismos jurídicos a fim de satisfazer a gana por poder de uma instituição ou outra.
Não olvidar que o MP já tentou por sete vezes aprovar emendas à Constituição e todas foram rejeitadas pelo legislador, de forma que esse poder que hoje eles alegam possuir, não parece ser tão claro.
Mas afinal se está discutindo? Se o MP é melhor ou pior que a polícia? Se é mais eficiente ou ineficiente?
Na verdade a discussão tem como foco saber, com base na técnica jurídica, SE dentro do sistema legal vigente NESTE PAÍS, SE dentro do atual Estado Democrático de Direito (Estado regido por LEIS) a investigação criminal autônoma realizada pelo MP é LEGAL. A resposta que se impõe é única: NÃO!
O enfoque aqui será dado basicamente aos pontos que o MP tem batido constantemente: 1 - A PEC de alguma forma interfere nas atribuições de órgãos como BACEN, IBAMA, RECEITA e CPI´s? 2 - A PEC interfere nas atribuições constitucionais do MP, haverá prejuízo ao combate à corrupção?  3 - As investigações criminais realizadas pelo MP são válidas? 4 - A nível internacional como se dá a persecução criminal? 5 - Qual entendimento hoje da jurisprudência? 6 – A PEC 37 é incompatível com o propósito de compromissos internacionais assumidos pelo Brasil?
1 - A PEC não interfere no funcionamento de órgãos como Receita, Ibama e outros. Todos continuarão com suas atribuições normais. Tais órgãos não desempenham e nunca desempenharam investigações criminais, suas fiscalizações e relatórios administrativos, no entanto, poderão continuar sendo feitos e encaminhados diretamente ao MP ( ou mesmo á polícia), o qual poderá optar entre denunciar ou requisitar mais diligências policiais. Portanto, não é verdade que a PEC proibirá a fiscalização administrativa desses entes. Prevê, ainda, a PEC em um de seus substitutivos que todas as investigações (ilegais) realizadas pelo MP até a aprovação da Emenda serão convalidas.
2 - A PEC em absoluto interfere em qualquer atribuição constitucional ou legal do MP.
Art. 129. São funções institucionais do Ministério Público:
I - promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei;
II - ...
III - promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos

A Carta Magna não fala em momento algum que o MP poderá iniciar investigações sponte própria, atribui apenas a importante missão de promover o inquérito civil e a ação civil, que por óbvio não se confundem com investigação criminal, de sorte que onde há definição de atribuições explícitas não pode haver interpretações implícitas e extensivas, especialmente quando se está tratando de restrições às garantias individuais.
É exatamente o alargamento (ilegal) dessa interpretação de que se vale o MP a fim de justificar sua pretensa investigação criminal.
Em resumo, o MP continuará podendo desempenhar toda a gama de atribuições previstas na Constituição, Lei Orgânica e LC.
A aprovação da PEC 37 não acarreta qualquer prejuízo ao combate à corrupção.
Como bem dito pelo cidadão Pedro Magalhãe "O MP confunde o povo leigo fazendo parecer ser a mesma coisa as práticas de corrupção elencadas no Código Penal (investigação CRIMINAL) e os atos de corrupção referentes à improbidade administrativa os quais devem ser apurados através de investigação CIVIL. Quem apura a corrupção como crime é a polícia, mas quem apura a corrupção administrativa (o desvio de verba pública, o uso indevido de bens públicos, o mal uso do dinheiro do erário, a imoralidade administrativa etc.) é o MP através da Ação Civil Pública de apuração de ato de improbidade administrativa – condição esta que a polícia NÃO pode exercer porque não está autorizada por lei. Enquanto a polícia investiga com o Inquérito Policial o MP investiga com o Inquérito Civil (exclusividade dele). E a PEC37 não quer tirar esse poder do MP.
A investigação criminal muitas das vezes esbarra no foro privilegiado, não importa se Delegado ou promotor, é preciso que o Tribunal de Justiça autorize uma investigação contra um deputado ou prefeito, por exemplo. Portanto é muito mais eficaz o combate a corrupção quando se utiliza de ações de improbidade administrativa.
3 -  Em relação à validade das investigações realizadas pelo MP, sabe-se que hoje só no STF há mais de 100 ações contestando a legalidade dos atos praticados pelos promotores.
Um dos maiores problemas nas investigações ministeriais deve-se ao fato de que tal procedimento não é regulamentado por LEI.
Restrições às liberdades públicas precisam ser feitas sob o pálio da legalidade estrita e não com base em resoluções que extrapolam e muito o seu poder regulamentar, como é o caso da resolução nº 13 do CNMP.
 A resolução nº 13 pela qual o MP tentou regulamentar essa investigação sui generis é flagrantemente inconstitucional, mas a despeito de tal discussão, a elaboração do ato normativo visou em verdade regulamentar o art. 8º da LC 75/93 e o art. 26 da Lei 8.625/93. Ocorre que os citados dispositivos referem-se ao inquérito civil, o que faz crer que o ato normativo regulamentador inova na ordem jurídica, concedendo atribuições ao parquet onde a própria Lei Maior não a fez. Desta forma, uma investigação sem prazo, sem forma e o que é pior: sem controle.
Quando um agente público se torna responsável pela investigação criminal e pela ação penal, podemos ter o que em direito chama-se de “lógica da conclusão desejada”, o MP escolhe quem vai perseguir e direcionar seus atos à satisfação de uma futura denúncia, sem fiscalização, sem controle, nada o impedirá de arquivar o que lhe for conveniente. Quem é parte no processo deve trabalhar com os autos.
4 -  A persecução Criminal no Direito comparado.
Podemos começar afirmando que no CONGO, NIGER, BURUNDI E MOÇAMBIQUE não há inquérito policial e nesses países a investigação pertence ao MP. Ocorre senhores que tais países detém os piores IDH´s, além do alto índice de corrupção, segundo a ONU. Não há, desta forma, relação alguma entre índice de desenvolvimento humano e a forma de persecução criminal adotada por um país.
Um dos primeiros argumentos do MP contra a "PEC da Legalidade" é apontar a Itália, França, Portugal, Alemanha como modelos. Alguém já pensou porque não falam da Inglaterra?
Na Inglaterra o MP não investiga. Até 1986 sequer o MP podia denunciar Hoje ainda é assistido por Advogado quando denuncia. Lá é a POLÍCIA o órgão que dirige e até auxilia a denúncia.
Se for acusado, o suspeito terá direito a receber detalhes escritos sobre o delito imputado, que poderá encontrar-se em uma ‘lista de acusações no juizado de polícia’. A Polícia entrega então o caso ao Serviço da Promotoria da Coroa (‘Crown Prosecution Service’), o qual notifica e prepara o caso para o julgamento. É dever da polícia, com o conselho do serviço da Promotoria da Coroa, reunir as provas para sustentar uma acusação. Lá o serviço da promotoria é realizado por advogados assalariados, o seu papel é o de aconselhar a polícia, revisar a decisão de acusação e preparar os casos para julgamento e apresentá-los aos Tribunais.
Nos Estados Unidos, por sua vez, a investigação ministerial deve ser em conjunto com a polícia, o promotor nos EUA pode ser sumariamente exonerado do cargo pelo prefeito! Portanto, não há razoabilidade em tal comparação. Nos Estados Unidos da América, não existe um juiz investigador ou um juiz de instrução (sistema em declínio). A fase da investigação inicial está confiada aos agentes policiais e às agências federais de investigação, que logo entregam o informe (nada mais que o nosso inquérito policial) ao Promotor e este então determina se há ou não elementos para apresentar a prova ante o ‘Grand Jury’.
A Europa "continental" tem ora um promotor ora um juiz investigador por um motivo simples: sofreu regimes totalitários, diferentemente da Inglaterra
Da Alemanha de Hither, o promotor investiga; na França o juizado de instrução (já em falência) tem nascedouro em Napoleão, invejado por Hitler que também queria dominar o mundo; na Itália de Mussoline, o juiz investigava até há pouco, mas em 1988 passou para o promotor (que também é juiz), porém, os promotores praticaram tantos abusos que editaram em 1996 a Lei da Investigação Defensiva (extremamente custosa para o investigado, mas foi um paliativo); em Portugal e França temos os regimes totalitários conhecidos por nós, pois o vivemos aqui.
O que deu o poder de investigação aos promotores na Europa CONTINENTAL, a história mostra isso, foi o totalitarismo, as ditaduras. (ler o artigo: Os arquivos da ditadura guardam segredos incômodos para o MP)
Comparem o humanismo do Brasil com a Inglaterra e não com UGANDA. A Inglaterra tem sua origem constitucional da famosa Carta de João Sem Terra de 1215.
Nosso Constituinte Originário afastou há época o Delegado do processo. Antes dela, o delegado podia "oferecer denuncia" nas contravenções. O constituinte viu o absurdo e deu ao MP a ação penal com exclusividade para evitar os excessos dos delegados, assim, não podemos agora inverter as regras e conceder ao MP poderes de investigação, instituição que hoje detém atribuições como em nenhum outro país.
“Ressalte-se que, nos mencionados países europeus, mesmo sendo o Ministério Público quem dirige as forças policiais durante toda a duração da fase preparatória, na prática, porém, constata-se, amiúde, que esta dependência funcional é mais teórica que real, e que a polícia goza freqüentemente, de fato, de uma verdadeira autonomia”( http://www.abjt.org.br/index.php?id=99&n=92-)
Como podemos perceber a persecução criminal possui diferentes matizes, aqui temos uma estrutura organizacional concursada, lá os chefes de polícia não são graduados em direito, não há muita similitude no critério de seleção, é tudo bem diverso do que acontece no Brasil, portanto, totalmente desarrazoado o paradigma.
5 -  A jurisprudência ainda vacila, só no STF, repito, mais de 100 (cem) ações contestam a legalidade do poder de investigação do MP.
Encontra-se suspenso no plenário do STF a decisão acerca do poder de investigação do MP. Até o memento votaram seis juízes, sendo 4 (Joaquim Barbosa – oriundo do MP, Gilmar Mendes – oriundo do MP, Celso de Melo – oriundo do MP e Aires Brito) favoráveis à investigação do MP e 2 contrários ( Ricardo Lewandowski e César Peluso). Nos votos favoráveis ao MP, todos foram com restrições, à exceção do min. Joaquim Barbosa.
Restam os votos de Luiz Fux (oriundo do MP e a favor, com restrições às investigações pelo MP), as ministras Rosa Weber e Cármen Lúcia, e os ministros Dias Toffoli e Marco Aurélio (estes dois últimos já se manifestaram contrários à investigação direta pelo MP). O ministro Teori Zavascki não vota porque ocupa o lugar de Cezar Peluso, que já votou. Portanto, a decisão será apertada, o que justifica ainda mais que o legislador se manifeste acerca da aprovação da PEC 37.
Ainda que esteja no plenário do STF tal discussão, essa matéria é atribuição do Congresso Nacional, onde democraticamente será estabelecido o real equilíbrio de forças.
6 – Compromissos internacionais assumidos pelo Brasil e a PEC 37. Em relação ao estatuto de Roma e outros tratados internacionais saiba que As convenções de Palermo (contra o crime organizado), de Mérida (contra a corrupção) e a das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional determinam tanto a participação do Ministério Público quanto da Polícia Judiciária no combate a esses crimes. Mas frisa que a atuação de cada um, assim como das demais autoridades, está regulada no ordenamento jurídico pátrio que não contempla a investigação criminal autônoma produzida diretamente pelos membros do Ministério Público.
CONCLUSÃO
“Triste do povo que ainda precisa de heróis” – a frase do distinto revolucionário vem a calhar com o espírito do MP sob a luz da estrutura do Estado Democrático de Direito.  Na visão do MP algumas instituições são “essencialmente boas” e outras “nem tanto” em que pese sejam ambas formadas pelos mesmos seres humanos falíveis.
Em nome de um suposto combate ao crime organizado, não podemos permitir a investigação criminal pelo MP sem que haja previsão legal e constitucional, caso contrário, este será, certamente, o primeiro passo para abrir mão de garantias constitucionais sedimentadas por séculos de lutas populares.
A título de exemplo Uma pesquisa realizada pelo Gabinete do Senador Ivo Cassol, de Rondônia revelou que de cada 10 casos de ajuizamento de ações do MP, pelo menos em 8 deles os agentes públicos foram absolvidos. A pesquisa com o fim de obter informações de atuais prefeitos e ex-prefeitos sobre a atuação do MP ouviu aleatoriamente 248 prefeitos em todos os Estados brasileiros.
Na opinião do senador, “os resultados foram impressionantes para revelar que membros do MP têm atuado de forma política - buscando satisfazer interesses distintos daqueles relativos ao desempenho estrito de suas funções. Buscam os holofotes da mídia e fazem verdadeiras devassas na vida de pessoas públicas. A lei precisa criar medidas mais práticas para que esses maus operadores públicos do direito sejam eles mesmos colocados sob os holofotes de seus superiores e da sociedade.”
O MP é hoje uma instituição hipertrofiada o que tem prejudicado sua atuação em áreas tão importantes quanto a criminal. Não se deseja alijar o MP das investigações criminais realizadas pela Polícia Judiciária, ao contrário, deseja-se que essa instituição trabalhe em parceria, mas que  sejam obedecidos os ditames legais do ordenamento pátrio.
Ressalte-se a importância do pronunciamento do o Subprocurador Geral da República e atual Corregedor Geral do MPF Eugênio Aragão à tentativa maniqueísta da instituição (ou parte dela) de se apresentar como agente exclusivo do bem, contrapondo-se a outras autoridades, em especial do Poder Executivo, condenadas a encarnarem o mal:
“A relação entre o Ministério Público e o governo (ou Poder Executivo) passou a ser, ao longo dos últimos anos, muito conflitiva. Abandonando a postura de parceiro, a instituição passou a ser vista, pelo administrador, como risco à governabilidade”.
A ADEPOL assim propõe um pacto pela legalidade e a defesa da PEC 37.

Márcio Dominici
Vice presidente região leste – ADEPOL-MA

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