terça-feira, 3 de maio de 2011

No interior do MA Constituição Federal é aviltada, Pm representa e cumpre mandado de busca e apreensão domiciliar em ato típico de investigação de crime NÃO militar


Foi no sábado, dia trinta de abril do ano em curso quando então recebi o telefonema de um companheiro que do outro lado da linha se mostrava indignado com uma situação que lhe era apresentada no plantão de polícia.

O delegado relatava-me que uma guarnição da polícia militar acabara de comunicar o cumprimento de um mandado de busca e apreensão domiciliar, o qual culminou com a prisão de determinada pessoa, sendo esta conduzida à delegacia a fim de que fossem tomadas as providências de praxe.

O festejado mandado de busca fora solicitado e cumprido por policiais militares.

Certamente não foi a primeira vez que um juiz (este faz parte de uma minoria, os que continuam a obedecer a CRFB ainda são maioria) de forma completamente equivocada determina a expedição de mandado de busca elaborado por autoridade sem qualquer legitimidade, assim como não foi a primeira vez que o MP agiu com vergonhosa indiferença diante de tamanho descalabro jurídico. (acerca do assunto conferir o Editorial do Boletim do IBCCRIM de junho de 2009, que chama a atenção para os riscos das indiferenças (ministerial e judicial) que têm alimentado o que os policiais militares chamam de “ciclo completo de polícia”)
É a Constituição da República Federativa do Brasil quem estabelece as atribuições de uma e outra instituição, in verbis:
“Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
I - polícia federal;
II - polícia rodoviária federal;
III - polícia ferroviária federal;
IV - polícias civis;
V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.
(...)
§ 4º Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações penais, exceto as militares (grifo nosso).
§ 5º Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil.”
É justamente em decorrência desse §5º do art. 144 da CF que a Corregedoria-Geral de Justiça do Rio Grande do Sul orienta os juízes a apenas expedirem mandados de busca e apreensão para a polícia militar de forma excepcional e “em casos específicos, quando premente necessidade de imposição da ordem pública” (Ofícios Circulares 47/99 e 226/07), o que aconteceria, por exemplo, em situações de calamidade pública ou no caso de greve das polícias judiciárias.
É também justamente em decorrência do §4º do art. 144 da CRFB que bem registra Cleunice A.Pitombo, no sentido de que os mandados de busca e apreensão deverão ser cumpridos “pela polícia civil, órgão da administração direta com função de polícia judiciária, nos limites de sua atribuição” cabendo à polícia militar, em vez de usurpar funções conferidas a outros órgãos policiais, repassar às polícias judiciárias eventuais informações que demonstrem fundadas suspeitas para buscas em residências.

Ora, se às policias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública e às polícias civis as funções de polícia judiciária e a apuração das infrações penais EXCETO AS MILITARES (estas atribuição das policias militares) por qual razão a polícia militar praticaria atos típicos de investigação de crime NÃO MILITAR, representando e cumprindo mandado de busca e apreensão domiciliar? Não é apenas o CPP que está sendo vilipendiado, ainda que alguns malabaristas do direito processual penal insistam em dizer que a legislação processual penal não é “clara” em atribuir apenas ao delegado de polícia a representação por mandados de busca, é própria Constituição Federal que é aviltada.

O Trâmite do pedido
Até mesmo a interpretação da legislação pátria pelo poder judiciário precisa ter limite, o coruchéu de tanto contorcionismo jurídico tem sido a exibição de decisões eivadas de controvérsias, para dizermos o mínimo, vejamos adiante.

Após receber a “representação” pelo respectivo mandado de busca, a magistrada encaminhou o pedido ao MP que sabiamente argüiu a ilegitimidade do pretenso representante e in continenti representou expont propria pelo mandado de busca. Bom, até aqui nada a conspurcar o trâmite do pedido, mas aos quarenta e cinco do segundo tempo a juíza concedeu o pedido, agora formulado pelo MP (menos mal) e o encaminhou à PM a fim de que esta desse o devido cumprimento, o MP desta feita nada disse, silenciou candidamente.

Quanto a decisão judicial é como se dissesse: “Não importa que o ato de investigação em análise não seja de natureza militar, não importa que a atribuição para tal ato seja da polícia civil, não importa o que a constituição federal assevera em seu art. 144 §§ 4º e 5º, não importa que o cumprimento do mandado, dentre outras, visa a segurança da prova material (Titulo VII DA PROVA), só importa o que  – eu-  acho e assim determino que a polícia militar investigue  crime de natureza NÃO militar e cumpra o mandado de busca e apreensão domiciliar, os direitos fundamentais não tem prevalência diante da necessidade de se ‘manter a segurança pública” .

Não se está aqui a defender a impunidade, mas é de clareza solar que apenas em casos extremos e raros, quando a polícia civil restar completamente impossibilitada/impedida de cumprir seu papel constitucional é que poderá ser admitida e tolerada a concessão de mandados de busca e apreensão domiciliar para cumprimento pela polícia militar.

Conceder mandado de busca e apreensão domiciliar para que militares adentrem em residência de civis é violar direitos fundamentais e a ordem jurídica como bem explanou o Del. Fábio Mota Lopes, o qual traz ainda à colação os ensinamentos de Giacomolli, que analisando o princípio do due process of law, afirmou que: “no processo penal, desde a investigação, devem ser observados, rigorosamente, as fórmulas e os ritos estabelecidos pelo legislador, que se destinam ao estabelecimento de limites ao poder dos agentes estatais. Destarte, existindo representação por buscas domiciliares e cumprimento dessas diligências por órgão que não possua tal atribuição, estar-se-á diante de flagrante inconstitucionalidade, por violação do princípio do devido processo legal”.

A Constituição Federal reservou à Polícia Militar a honrosa e dificílima missão de preservar a ordem pública e ainda atuar nas investigações de crimes militares, daí que não cabe ao delegado de polícia invadir essa seara e investigar crimes de natureza militar, seria um absurdo se a polícia civil agisse dessa forma.

Finalizando trago à baila decisão da min. Ellen Gracie, em voto proferido na ADI 3.614/PR, que declarou a inconstitucionalidade de decreto paranaense que conferia a policiais militares funções exclusivas de delegados de polícia, entre as quais a lavratura de termo circunstanciado, “as duas polícias, civil e militar, têm atribuições, funções, muito específicas e próprias, perfeitamente delimitadas” na Constituição Federal e que não podem ser confundidas.

Por todo o exposto, temos que a prova produzida por meio de cumprimento de mandado de busca domiciliar levado a efeito por milicianos é ilícita por violar preceitos constitucionais, posto que seja atribuição da polícia judiciária a representação pela festeja medida cautelar, eventual prova produzida nestes termos deverá ser desentranhada do futuro processo.

Por Márcio Dominici – Delegado de Polícia









2 comentários:

  1. Na verdade, essa é so mais uma da funções usurpadas pela Polícia Militar da Polícia Judiciária. Aqui no Ceará, a função de investigar passou quase que exclusivamente para os militares. Foram criadas seções de inteligêcia dentro dos batalhões que fazem as vezes de Polícia Judiácia. Ao longo dos anos houve uma precarização da Polícia Judiciária em nosso estado - e acredito que em grande parte do Brasil - onde os Policiais Civís nada mais fazem do que "pastorar" presos em delegacias super lotadas. Aqui, o efetivo da Policia Civil chega a ser menor do que o da Guarda Municipal de Fortaleza. Sem falar que, segundo dados dos Jornais, atualmente, esse efetivo é menor que o existente em 1984. Apenas com esses dois dados podemos vislumbrar os motivos pelos quais o Estado do Ceará conta, atualmente, com um dos maiores índeces de homicídios no Brasil. Estados com a envergadura do Ceará, como Pernambuco, diminuíram sensivelmente os índices de criminalidade, com políticas de investimentos no efetivo da policia civil e em meios materiais. Certamente que essas políticas não vão findar com a violênica, mas já se observa um horizonte de melhorias.

    Ribeiro Junior (billy-fz)- Fortaleza-ce

    ResponderExcluir
  2. Isso caracteriza usurpação de função pública. Cabe tco contra os pm's aviltantes da c.f.

    ResponderExcluir