Especialistas defendem implantação de inquérito digital
Especialistas defendem implantação de inquérito digital
A
Lei 11.419, de 2006, que institui o processo judicial eletrônico, não
traz em seu texto a palavra “inquérito”. A informatização desta fase,
porém, tem sido demanda de advogados e delegados. Como faz parte do
processo penal, o inquérito teria, na opinião dos especialistas, de ter
seu andamento também disponibilizado na internet, como já acontece com
os processos eletrônicos.
Atualmente,
o acesso a inquéritos só é possível ao advogado que vai diretamente às
delegacias, ao Departamento de Inquérito Policial (Dipo) ou ao próprio
Ministério Público. Como o documento é único, muitas vezes ele não está
no primeiro local para o qual o advogado se dirige, como explica Érico Della Gatta,
presidente da Comissão de Direitos e Prerrogativas da subseção 116 da
Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo na capital, que abrange os
bairros do Jabaquara e Saúde.
Della Gatta já enviou ofício
ao presidente e ao corregedor do Tribunal de Justiça de São Paulo,
desembargadores Ivan Sartori e José Renato Nalini, respectivamente,
propondo que seja baixada uma resolução que viabilize consultas de
andamento de inquéritos policiais via internet.
O
projeto, diz ele, visa a diminuir o fluxo de advogados nos cartórios do
Dipo, que, diariamente, respondem por mais de 4 mil consultas
questionando apenas onde o inquério está.
“Muitas
vezes, vou à delegacia e lá me dizem que enviaram o inquérito ao Dipo.
Vou ao fórum — onde fica o Dipo — e me dizem que está com o Ministério
Público. Pela estrutura do Ministério Público, é mais difícil consultar o
documento por lá. Tenho, então, que esperar devolverem ao fórum,
simplesmente para consultar o andamento”, conta Della Gatta.
Segundo
o advogado, a demora e a tramitação complicada abrem, inclusive,
brechas para a corrupção. “Vemos advogados se aproveitando disso,
oferecendo vantagens a delegados para retardar o andamento do inquérito,
para que os crimes investigados prescrevam”, conta. Com o acesso ao
andamento do inquérito pela internet, diz, será mais fácil identificar
onde está e há quanto tempo, e o motivo disso.
Modelo aprovado
O delegado de Polícia e doutorando em Direito Penal Ruchester Marreiros afirma que o inquérito digital já implementado no Rio de Janeiro pelo programa Delegacia Legal, de informatização e modernização das delegacias da Polícia Civil do estado, pode servir como modelo para o sistema a ser implementado em todo o país.
O delegado de Polícia e doutorando em Direito Penal Ruchester Marreiros afirma que o inquérito digital já implementado no Rio de Janeiro pelo programa Delegacia Legal, de informatização e modernização das delegacias da Polícia Civil do estado, pode servir como modelo para o sistema a ser implementado em todo o país.
Apesar
de digital, o inquérito digital do Rio de Janeiro só pode ser acessado
por membros da Polícia ou do Ministério Público no estado. Para
franquear o acesso à população, explica o delegado, seria preciso
implementar ferramentas como o uso de senhas por advogados e pessoas
citadas, evitando assim a superexposição dos envolvidos nas
investigações.
Ganho
incontestável para os investigados, por ampliar o direito de defesa, um
sistema nacional de acesso a inquéritos poderia auxiliar também o
trabalho da Polícia e do MP, afirma Marreiros.
“Já
peguei caso de um estelionatário com identidade diferente em quatro
estados, sendo que, em um deles, o processo já estava instaurado e havia
mandado de prisão expedido. Se o inquérito fosse eletrônico e
acessível, eu poderia consultar em poucos minutos na internet, imprimir o
mandado e prendê-lo naquela hora, mas só fui descobrir sobre tudo isso
depois que já havia soltado o criminoso.”
Além
disso, explica, ao possibilitar melhores defesas no inquérito, o
sistema evitaria o atulhamento da Justiça com processos que não se
sustentarão. “A lei veda a condenação com base no inquérito, mas não a
absolvição e, aumentando o acesso da defesa ao inquérito, ficará mais
fácil comprovar que não há crime antes mesmo de se instaurar a ação.”
Segundo
o delegado, a regulamentação do inquérito eletrônico pode ser feita
utilizando como base a Lei 11.419, que, apesar de não fazer qualquer
referência a inquéritos, diz, no primeiro parágrafo de seu primeiro
artigo, que deverá ser aplicada “indistintamente, aos processos civil,
penal e trabalhista”. Como o inquérito é parte do processo penal, diz
Marreiros, nada impede que a lei se aplique a ele, como já se aplica aos
processos judiciais.
Marcos de Vasconcellos é repórter da revista Consultor Jurídico.
Revista Consultor Jurídico, 28 de abril de 2012
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