A PEC 19/2011 e a Carreira dos Delegados de Polícia
por Fernando Capez
A
proposta de emenda constitucional enviada pelo Governador Geraldo
Alckmin à Assembléia Legislativa de São Paulo, ao final aprovada,
representou significativo avanço no sistema criminal paulista e uma
conquista da sociedade. De acordo com o novo texto da Carta
Constitucional bandeirante, “a Polícia Civil exerce atribuição essencial à função jurisdicional do Estado e à defesa da ordem jurídica” e “aos Delegados de Polícia é assegurada independência funcional pela livre convicção nos atos de polícia judiciária”.
Ao
reconhecer a essencialidade da função de polícia judiciária à prestação
jurisdicional, a PEC confere nível constitucional à persecução penal
desde o seu primeiro instante. O Estado, enquanto ente dotado de
soberania detém com exclusividade o poder de punir. Mesmo nas ações
penais privadas, o que se delega ao particular é apenas a iniciativa da
demanda, remanescendo com o Poder Público o chamado jus puniendi.
Ao
ser praticada uma infração penal, esse poder de punir, que é abstrato e
dirigido indistintamente a todos, concretiza-se, transformando-se em
uma pretensão concreta de submeter o infrator à punição prevista em lei.
O Estado, para viabilizar a satisfação do seu jus puniendi,
segue uma série de procedimentos de caráter persecutório, que se inicia
no âmbito administrativo e se encerra com a instauração do processo
penal e a prolação de uma decisão judicial de condenação ou, quando não
comprovada a responsabilidade do acusado, de absolvição.
Tal
procedimento se inicia com a investigação policial, a cargo da Polícia
Judiciária. A função de Delegado de Polícia, portanto, integra a
seqüencia de atos administrativos que compreendem a primeira fase da
persecução penal, a chamada persecutio criminis extrajuditio.
Principia com a instauração do inquérito policial ou a lavratura do
auto de prisão em flagrante e se encerra com o término das
investigações, mediante a elaboração de um relatório. Durante essa fase,
cabe à autoridade policial classificar provisoriamente a infração penal
com o fim de arbitramento de fiança, prisão em flagrante, remessa dos
autos ao JECRIM, representação para decretação da prisão temporária ou
preventiva e uma série de outros atos que envolvem apreciação
discricionária e conhecimento jurídico.
Integra
assim, um encadeamento causal unidirecional voltado à prestação de
jurisdição. Sem prova do crime e indícios de autoria não há processo
criminal, e sem contraditório e ampla defesa não há sentença, de modo
que tudo se funde em uma só seqüencia de atos oficiais de natureza
persecutória.
Além disso, ao assegurar a liberdade de convicção, mediante prévia fundamentação, a PEC colocou a fase inicial da persecutio criminis
sob o manto protetor do princípio da impessoalidade, sintonizando-se
com as exigências próprias do Estado Democrático de Direito e com as
imposições principiológicas estatuídas pelo art. 37 da CF.
O
Governo do Estado mostra, com isso, o desejo de uma polícia cada vez
mais profissional e voltada à satisfação do interesse público,
valorizando a atuação técnica de seus integrantes. Registre-se a
importante e decisiva atuação da Associação dos Delegados de Polícia, em
sua competente diretoria, presidida pela Dra. Marilda Aparecida
Pansonato Pinheiro, que soube conduzir os trabalhos de convencimento dos
Poderes Executivo e Legislativo, de modo consistente, deixando
transparecer sua empolgação com o exercício da atividade policial e
pleiteando os instrumentos jurídicos necessários ao seu desempenho
eficaz, no interesse da coletividade.
Conheci
a Dra. Marilda há muitos anos, como minha aluna, quando começava a
lecionar direito penal no Complexo Jurídico Damásio de Jesus. Mais
tarde, a reencontrei como a combativa e severa presidente da classe dos
delegados de polícia que me cobrava apoio. Depois de conhecer todos os
projetos de lei e indicações que eu havia feito no sentido de melhorar
sensivelmente as condições estruturais e a remuneração da classe dos
Delegados de Polícia, nasceu uma relação de confiança, propiciando uma
atuação sinérgica, na qual, pudemos trabalhar lado a lado na consecução
de objetivos maiores. Pude, assim, conhecer a honrada e vocacionada
autoridade policial, cuja energia contagia e motiva a todos nós, nessa
nobre causa de valorização das carreiras policiais, inclusive no plano
salarial.
Com
essa conquista, que contou com o apoio do Governador Alckmin, a ADPESP
firma relevante compromisso com sua classe e a sociedade e faz renascer a
esperança de uma polícia mais valorizada.
Fernando Capez é procurador de justiça licenciado, professor de direito penal e processo penal, e deputado estadual pelo PSDB
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