terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

Motim de PMs ameaça se espalhar pelo País


Motim de PMs ameaça se espalhar pelo País

Reportagem: Raphael Di Cunto, Murillo Camarotto, Paola de Moura e Marcos de Moura e Souza
O motim da Polícia Militar da Bahia, que deixou o Estado refém de saques à lojas, assaltos e com sensação de insegurança – já foram registrados 93 homicídios na região metropolitana de Salvador desde terça-feira, quando começou a paralisação – pode chegar a outras regiões do país, alertou ontem a Associação Pernambucana dos Cabos e Soldados (ACSPE).
Segundo a associação, há um movimento da corporação por melhores salários e condições de trabalho. “Os policiais e bombeiros militares de Pernambuco devem ficar atentos. A qualquer momento a ACS convocará uma assembleia geral para discutir assuntos de interesse da tropa, especialmente sobre as escalas de trabalho escravizantes, a falta de previsão de promoções e outras reivindicações que não foram atendidas, o que vem gerando grande insatisfação”, diz o comunicado.
O presidente da Associação dos Militares de Pernambuco, capitão Vlademir Assis, afirmou que uma mobilização nacional para pressionar pela aprovação no Congresso da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 300, que estabelece um piso nacional para a PM em mais de R$ 4 mil, servirá para atrair de novo a atenção do país para a causa dos policiais e bombeiros.
O entusiasmo dos policiais pernambucanos com a proliferação das paralisações está amparado no clima de insatisfação com o governador Eduardo Campos (PSB). Segundo Assis, o Executivo comportou-se de forma autoritária durante as últimas negociações salariais, encerradas em março do ano passado. A crise se acentuou depois que o governo cancelou o desconto automático da contribuição para a associação na folha de pagamento dos policiais.
Alagoas também está perto de ver um motim – nome dado à greve de militares, que são proibidos de descumprir a ordem de seus superiores e, portanto, realizar paralisações. A Associação dos Oficiais Militares de Alagoas fará assembleia geral na quinta-feira para reivindicar um posicionamento do governador Teotonio Vilela Filho (PSDB), que não teria cumprido o acordo de junho do ano passado.
Entidades que representam policiais militares e bombeiros do Espírito Santo, Acre e Rio de Janeiro farão assembleia até o fim da semana para decidir se param. No Rio Grande do Sul, depois de uma mobilização em 2011, a PM também vive um clima tenso com o governador Tarso Genro (PT).
O diretor de relações institucionais da Federação Nacional de Entidades de Oficiais Militares Estaduais (Feneme), coronel Elias Miller, diz que a culpa das paralisações é do governo federal e dos estaduais, que não conversam com a categoria. “A PEC 300 acendeu o que estava latente. Os policiais militares, que sempre foram treinados para esperar o comando, resolveram sair às ruas para reivindicar seus direitos”, afirmou.
Miller não concorda com o motim, “por ser ilegal”, mas diz que o compreende. “Uma associação sem expressão na Bahia lançou a greve. As maiores entidades não apoiaram, mas a tropa aderiu porque está insatisfeita com um governo que não a ouve, que não trata os policiais como trabalhadores que querem um salário melhor para sustentar suas famílias”, criticou, referindo-se à postura do governador da Bahia, Jaques Wagner (PT), um ex-sindicalista.
Vice-presidente da Associação Nacional de Entidades Representativas de Praças Militares Estaduais (Anaspra), que é ligada à entidade que iniciou o motim baiano, o cabo Jeoás Santos nega que o movimento esteja tentando ganhar proporções nacionais. “Queremos organizar essa desordem porque todos os Estados planejam ações”, afirmou.
Ele afirma que a maior briga não é pela PEC 300, mas para que os governos estaduais cumpram os acordos e pela desmilitarização da categoria. “Atuamos dentro de uma legislação velha, com estatutos e código penal que não sofreram alteração desde a ditadura militar [1964 - 1985]“, afirma. “O policial tem de ser punido se cometer algum delito, e não por não ter prestado continência”, defende Santos, cuja entidade nasceu de um motim generalizado em 1998, quando a PM parou em nove Estados.
No Rio de Janeiro, o presidente da Associação de Praças da Polícia Militar e Corpo de Bombeiros do Estado (Aspra-RJ), Vanderlei Ribeiro, convocou assembleia de greve na Cinelândia para quinta-feira. “Não queremos ser escravos ou massa de manobra da cúpula do governo. Se for necessário, paramos no Carnaval”, afirmou.
Ao contrário do que fez em 2011, quando não negociou e enfrentou um motim de mais de um mês no Corpo de Bombeiros, o governador Sérgio Cabral (PMDB) anunciou novo aumento e fez elogios às corporações. “Eu confio nos profissionais da segurança. Eles são responsáveis. Quando entram nessa profissão, sabem que esse é um serviço essencial. Tanto os nossos policiais militares, quanto os nossos bombeiros militares, quanto os nossos policiais civis sabem a importância que isso tem para a população. Não tenho dúvida de que vamos garantir não só um Carnaval, mas um dia a dia de tranquilidade”, minimizou.
Cabral também antecipou parte do aumento parcelado em 48 meses, que foi concedido após a greve dos bombeiros do ano passado. “A partir do projeto de lei que enviamos à Assembleia Legislativa, o salário base será de R$ 1.669. Com as gratificações que pagamos aos nossos profissionais que estão nas ruas, o salário base de um PM e de um bombeiro será de R$ 2.019″, afirmou em nota.
Nas contas do governador, o aumento total desde 2007, quando assumiu, até 2013 será de 107%. Os números são rejeitados por Vanderlei, que diz que o salário-base continua em torno de R$ 900.
O aumento também será escalonado em São Paulo, Rio Grande do Norte, Pará e Minas Gerias. No Paraná, os policiais pressionam o governador Beto Richa (PSDB) pela regulamentação de uma emenda à Constituição estadual que prevê o pagamento de subsídio para a PM. A proposta é elevar o salário de soldado, que hoje recebe R$ 2,4 mil mais gratificação, para R$ 4,5 mil.
Os policiais mineiros ganharam a fama de conseguir bons acordos nos últimos anos com o governo do Estado sem grandes confrontos. O último ocorreu em 2004, quando os PMs cruzaram os braços durante quase uma semana, o número de alguns crimes subiu e o Exército foi para as ruas. A pressão deu resultado e desde então os policiais têm tido aumento todos os anos.
No ano passado, os policiais militares voltaram à carga com assembleias e mobilização. Houve um início de adesão a uma paralisação de policiais civis e o governo Antonio Anastasia (PSDB) aceitou, então, levar a questão para a mesa. Concedeu um aumento salarial escalonado de quase 100% – como queriam os PMs – até 2015. Hoje o salário inicial de um PM mineiro é de R$ 2.245,90; pelo novo acordo, será de R$ 4.098,41 em 2015. O aumento valerá para todos os postos. No topo da carreira, um coronel veterano com adicionais ao salário que hoje pode ganhar R$ 12,9 mil receberá R$ 23,6 mil em 2015.
“Aprovamos em julho uma lei escalonando o aumento. Com isso, acalmamos a pressão dos nossos militares pela aprovação da PEC 300″, diz a subsecretária de Gestão de Pessoas da Secretaria de Planejamento do Estado, Fernanda Neves.
Situação diferente da Bahia, onde salário inicial é de R$ 1.943 e o governo não sinalizou com novos aumentos. Os policiais que estão acampados com suas famílias na Assembleia Legislativa dizem que Wagner não cumpriu acordo feito em 2009, de aumentar a gratificação da PM, e que tem desprezado o movimento que o PT apoiou em 2001, quando o governador era César Borges (no então PFL).
O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, afirmou que a discussão do governo para incorporar a gratificação aos salários da PM baiana “acabou sendo atropelada por alguns policiais” que usam de violência e ações criminosas. O ministro petista também se disse contrário à aprovação da PEC 300, que traria gastos “insuportáveis” para os Estados.
Houve quatro confrontos ontem dos cerca de 500 grevistas com o Exército, Forças Armadas e a tropa da choque da PM em frente à Assembleia Legislativa. O local está cercado desde a madrugada de anteontem para, segundo o Exército, isolar os manifestantes, executar mandados de prisão e depois esvaziar o prédio.
As forças federais usaram bombas de efeito moral e gás de pimenta foi lançado contra a multidão. Balas de borracha forma disparadas e feriram cinco pessoas sem gravidade. Sitiados e armados, grevistas diziam que resistiriam a tentativas de invasão. Eles estão sem luz e água. O Exército dizia que não faria a desocupação à força.
A crise provocada pela greve paralisou os Poderes do Estado. Servidores do governo, do Tribunal de Justiça e do Ministério Público foram retirados dos prédios onde trabalham, pois eles ficam ao lado do edifício da Assembleia. (Colaborou Marli Lima, de Curitiba, com agências noticiosas)
Fonte: Jornal Valor Econômico/ Foto: Marcello Casal Jr./Agência Brasil

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