A falácia da culpa do outro
Em artigo, agente de
polícia federal critica o movimento “Fora DG” e conclama a uma maior
solidariedade entre as categorias dentro da instituição
"A manifestação pela saída do DG no dia 25 de julho causou estranheza. O
representante da FENAPEF assim articulou: "Queremos alguém de fora da
polícia, alguém com noção do trabalho, mas que principalmente tenha
conhecimento na área de gestão e inteligência para administrar todas as
situações". Difícil de imaginar que alguém com “noção” do trabalho e com
conhecimento de gestão e inteligência possa administrar “ todas” as
situações. Em primeiro porque ninguém é tão competente e inteligente que
possa açambarcar toda e qualquer situação, apenas com noção do
trabalho, ainda que tenha conhecimento de gestão e de inteligência. Em
segundo porque inaudito que alguém de fora do órgão tenha experiência
suficiente e disposição para lidar com o complexo problema da
distribuição do poder, entre os integrantes da carreira policial
federal.
No mínimo uma contradição se encerra no pleito levado às ruas, pelos 400
policiais, recentemente. Servidores reclamam do assédio moral e
desrespeito interno, por conta da exclusão que “em tese” sofrem por
parte dos delegados, por não tomarem parte das posições de comando e
decisão à frente do órgão DPF; experientes que são os agentes, escrivães
e papiloscopistas, críticos persistentes do sistema vigente. Ao tempo
em que discordam publicamente que delegados novatos chefiem setores
importantes, de delegacias e superintendências e propalam o discurso da
necessidade de tempo de serviço no âmbito interno, como regra que os
capacitem para exercer comando.
Vivemos uma patologia em sociedade marcada por três sintomas básicos: a
ansiedade, a frustração e o cinismo. Nosso comportamento está regulado
pela economia de mercado. A vontade pelo poder para a satisfação de
objetivos próprios que isola o indivíduo em si mesmo, tornando-o um
ansioso, a frustração pelo constante ato de comparação com o que o outro
é ou tem que o faz irritadiço e o cinismo em não admitir a
responsabilidade dentro do contexto, pela falta de solidariedade com o
grupo, criando a falsa ideia de que a culpa é do outro, de algum
delegado ou até mesmo do Diretor Geral. Que todos querem lugar ao sol é
um fato, uma necessidade, um objetivo, até mesmo, legítimo. Mas existe
intrínseco em toda essa guerra suja, oculto no lodaçal das vaidades,
aquilo que ninguém quer admitir: A sabotagem de verdadeiras lideranças
que se consuma pelos membros de uma mesma classe, e em todas elas, numa
perspectiva de angariar poderes próprios.
Nesse diapasão é que se desvela a guerra de classes internas, em que se
apontam culpados na hierarquia, pelo problema do assédio moral em que
vivem os subalternos. Equivocadamente, supondo que a mão pesada vem de
cima, quando na verdade o tapete é puxado por quem está do lado.
Deixa-se de apoiar o colega, cansado, fatigado, extenuado na rotina de
carregar o piano, em troca de uma posição melhor dentro da orquestra.
Quem vai subindo na escada da promoção pessoal, vai se esquecendo de
quem fica lá em baixo. Para que lutar por melhores condições de trabalho
que poderiam ser resolvidas com mais diálogo, solidariedade e
franqueza, em nível local, se cada um está resolvendo seu problema de
forma individual?
“Farinha pouca, primeiro meu pirão” diz o ditado! O problema não é o
dono da banda, mas a moda que a banda toca. Eis o equívoco e o cinismo,
em não admitir que falta-nos sermos mais solidários, éticos e humanos,
menos ambiciosos, individualistas e egoístas, a fim de nos juntarmos
todos, em prol de um objetivo mais uníssono que reflita uma instituição
mais justa e ética, internamente, pois, preocupada com a existência
moral de cada um de seus membros.
A orquestra está desafinada, sem harmonia, por isso tanta insatisfação,
tanta insegurança. O discurso “da culpa do outro” é uma ilusão, uma
falácia que encobre a real dificuldade e que pode levar a PF não a
“explosão”, mas o que é pior, a implosão, ao suicídio! “Nenhum reino
dividido contra si mesmo poderá subsistir”. Palavras do Mestre! Pede-se
um diretor isento para “não favorecer nenhum dos lados”. Que lado?
Deveríamos estar todos do mesmo lado. Solução paternalista, não resolve.
Ser adulto é dialogar com frequência. Faculte-se espaço aos líderes e
os conflitos serão dirimidos. A questão é precipuamente na base, não
somente no topo. “O homem que deseja uma mudança no mundo deve se olhar
no espelho.”
Átila de Barros, agente especial de polícia federal
Nenhum comentário:
Postar um comentário