quinta-feira, 10 de março de 2011

Loló, seu uso e tipo penal


Assunto que tormenta alguns operadores do Direito é a situação do loló como droga ilegal. Resta verificar no rol dos psicotrópicos da Anvisa sobre seu reconhecimento como substância que causa dependência física ou psíquica e o condicionamento como verdadeira droga ilícita.

Há entendimento doutrinário e jurisprudencial que afirma que o clorofórmio, substância que compõe do loló, não está definido como produto que causa dependência. É o que destaca a Anvisa. Logo, não poderá o sujeito que porta loló ser autuado como usuário ou traficante de tal droga, mas, sim, em tese, como autor do crime tipificado no art. 278, do Código Penal.

Art. 278 - Fabricar, vender, expor à venda, ter em depósito para vender ou, de qualquer forma, entregar a consumo coisa ou substância nociva à saúde, ainda que não destinada à alimentação ou a fim medicinal:  Citado por 57

Pena - detenção, de um a três anos, e multa.

Modalidade culposa

Parágrafo único - Se o crime é culposo:  Citado por 3

Pena - detenção, de dois meses a um ano.

Substância avariada



Para reafirmar o que foi dissertado aqui, recente decisão do TJRN, de 11 de janeiro de 2011, expõe o mesmo pensamento. Veja abaixo.

TJRN - Apelação Criminal: ACR 91992 RN 2010.009199-2
Resumo: Apelação. Venda de Loló. Tráfico de Drogas (art. null12 da Lei n.º null6.368/76). Atipicidade.
Desclassificação Para a Conduta Descrita no Art. null278 do nullcp. Inteligência do Art. null383
do nullcpp. Falta de Comprovação da Materialidade Delitiva. Absolvição que Se Impõe.
Relator(a): Desª. Maria Zeneide Bezerra
Julgamento: 11/01/2011
Órgão Julgador: Câmara Criminal

EMENTA: APELAÇÃO. VENDA DE "LOLÓ". TRÁFICO DE DROGAS (ART. 12 DA LEI N.º 6.368/76). ATIPICIDADE. DESCLASSIFICAÇÃO PARA A CONDUTA DESCRITA NO ART. 278 DO CP. INTELIGÊNCIA DO ART. 383 DO CPP. FALTA DE COMPROVAÇÃO DA MATERIALIDADE DELITIVA. ABSOLVIÇÃO QUE SE IMPÕE.

1. O clorofórmio, componente do loló, não foi definido como substância que causa dependência física e/ou psíquica pela Portaria 344/98 (SVS/MS).

2. Em não havendo o enquadramento de referida substância na Portaria mencionada, correta é a capitulação do art. 278 do CP

3. Quando o laudo pericial nada diz sobre a nocividade à saúde da substância apreendida, não há como se comprovar a materialidade do tipo pena supramencionado, redundando, pois, na absolvição do réu.

4. Apelo conhecido e desprovido.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos em que são partes as acima identificadas:

Acordam os Desembargadores que integram a Câmara Criminal deste Egrégio Tribunal de Justiça, à  unanimidade de votos, em dissonância com o parecer da 1ª Procuradoria de Justiça, e negar provimento ao recurso de apelação, nos termos do voto da Relatora:

RELATÓRIO

O Representante do Ministério Público interpôs recurso de apelação contra a sentença proferida pela Juíza da Vara Única da Comarca de Jucurutu/RN (fls.159/161), que absolveu Maykell Pinheiro da Costa, após desclassificar o delito de tráfico de drogas (art. 12 da Lei nº 6368/76) para o de venda de outras substâncias nocivas à saúde pública (art. 278, caput do CP), sob o argumento da não comprovação da ofensividade à saúde do clorofórmio, princípio ativo do loló apreendido com o acusado.

Narra a denúncia que o acusado foi preso com vinte e seis (26) frascos de substância conhecida como "loló", quando as vendia no carnaval do município de Jucurutu, em 06 de fevereiro de 2005.

Em suas razões recursais (fls.165/168), o apelante requer a condenação do acusado no delito capitulado na exordial, tráfico de drogas, por entender que o clorofórmio, substância encontrada no "loló", é entorpecente.

O apelado deixou transcorrer in albis o prazo para apresentação das contrarrazões, consoante certidão de fl.170v.

A 1ª Procuradoria de Justiça opinou pelo conhecimento e provimento do recurso, utilizando-se dos mesmos argumentos despendidos pelo recorrente (fls.177/180).

É o  relatório.

Presentes os requisitos de admissibilidade, conheço dos presentes recursos.

VOTO

Conforme relatado, a insurgência do parquet reside no não reconhecimento do clorofórmio como substância entorpecente e, via de consequência, a ocorrência de tráfico de drogas.

O Ministério da Saúde, atendendo a regra de competência estabelecida no art. 36 da Lei nº 6368/76, editou a Portaria nº 344/98 (SVS/MS), atualizada pela RDC nº 63/07, listando o rol das substâncias definidas como entorpecente e que causam dependência física, e os componentes do "loló" (álcool etílico e clorofórmio) não foram ali relacionados, o que afasta a tipicidade do art. 12 da referida lei.

Neste sentido é a jurisprudência pátria:

"EMENTA: ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE. ECA. COLA DE SAPATEIRO. FORNECIMENTO A ADOLESCENTE. AUSÊNCIA DE PREVISÃO. PORTARIA DIMED-MS. ATIPICIDADE. Componentes químicos da substância não previstos na Portaria do DIMED/MS como produtores de dependência física ou psíquica desconstituem a tipicidade da conduta para a caracterização da figura penal do art. 243 da lei nº 8.069/90 (estatuto da criança e do adolescente)é necessário a demonstração de que a substância encontrada possa causar efetivamente dependência física ou psíquica." (TJRS -Apelação Crime nº 70020620878. Quinta Câmara Criminal. Tribunal de Justiça do RS. Relator: Aramis Nassif, julgado em 10/09/2008).

A situação fática dos autos, poderia se amoldar ao tipo penal previsto no art. 278 do Código Penal, conforme restou condenado o apelado:

"art. 278 -Fabricar, vender, expor à venda, ter em depósito para vender, ou, de qualquer forma, entregar a consumo coisa ou substância nociva à saúde, ainda que não destinada à alimentação ou a fim medicinal:

Pena -detenção de um a três anos, e multa".

Posição que, inclusive, já foi aceita nesta  Egrégia Corte:

"Habeas corpus -objetivo: liberdade do paciente e trancamento da ação penal -Concessão de liberdade provisória -Prejudicialidade do pedido quanto a soltura do paciente -Denegação da ordem em relação ao trancamento da ação penal -Tráfico de entorpecentes -Apreensão de grande quantidade de substância conhecida como loló . Inexistência de laudo definitivo concluindo não ser a substância apreendida de natureza entorpecente -Afirmação da inicial de ser conduta do paciente adequada ao tipo do art. 278 do Código Penal . Atipicidade inexistente. Justa causa para a ação penal. Denegação da ordem o Prosseguimento da ação penal"(TJRN, Tribunal Pleno, HC Rel. Des. Aderson Silvino). Grifos acrescentados.

No entanto, conforme asseverado na sentença recorrida, a materialidade deste delito não restou comprovada, eis que o laudo de fl.65, apesar de atestar a natureza da substância apreendida, qual seja, CLOROFÓRMIO, nada diz sobre a nocividade de referida substância à saúde, o que torna imperativa a absolvição do apelante

Ante o exposto, em dissonância com o parecer da 1.ª Procuradoria de Justiça, voto pelo conhecimento e desprovimento do recurso.

É como voto.

Natal/RN,  11 de janeiro de 2011.

DESEMBARGADOR CAIO ALENCAR
Presidente

DESEMBARGADORA MARIA ZENEIDE BEZERRA
Relatora

Dr. ANÍSIO MARINHO NETO
1º Procurador de Justiça



 

2 comentários:

  1. È NECESSÁRIO, POIS, QUE A AUTORIDADE POLICIAL QUESTIONE A PERÍCIA CRIMINAL QUANTO a nocividade à saúde da substância apreendida, CASO CONTRÁRIO não há como se comprovar a materialidade do tipo pena supramencionado, redundando, pois, na absolvição do réu.muito útil esse blog e suas notícias e informações. parabéns.

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  2. Acredito que se há uma normativa, estabelecendo o que seria ou não nocivo, ou o que causaria dependência , cito "Publicação – Diário Oficial da União Nº.127 - Seção 1 terça-feira, 3 de julho de 2012." não há o que a autoridade polcial questionar, cumpre o que está tipificado e pronto, é para isso que são pagos, garantir a segurança publica, baseados na lei. Até porque, são inumeras as substâncias que possuem caracteristicas alucinogenas, e que não estão sob regulamento algum, ora, toda vez que alguma dessa fosse apreendida caberia a autoridade policial questionar a autoridade regulamentadora?não, as drogas, ou substâncias ilicitas existem, e as que são nocivas a sociedade são proibidas por lei, conforme a portaria supramencionada. Seria dar muito poder a policia, permitindo que esta pudesse determinar o que é ou não droga.

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